terça-feira, 5 de março de 2013




DEPENDÊNCIA
Jenário de Fátima

Meu coração é qual grande deserto
Que tanto faz calor, tanto faz frio
Que tanto está fechado ou tanto aberto
Que tanto está amável ou está bravio

Ele ora está distante, ora está perto
Ele ora está constante, ora erradio
Ele ora está confuso, ora está certo
Ele ora se transborda, ou está vazio

E meio a todas estas metamorfoses
Meu coração se acalma ou se agita
Como um doente a depender de doses

De doses de alegrias e tristezas
Doses de convicções e incertezas
Daquela que lhe mora...Que lhe habita!

segunda-feira, 4 de março de 2013

Sonetos ao pai                                                                                                                                                                           Augusto dos Anjos

A meu Pai doente


Para onde fores, Pai, para onde fores,
Irei também, trilhando as mesmas ruas...
Tu, para amenizar as dores tuas,
Eu, para amenizar as minhas dores!

Que cousa triste! O campo tão sem flores,
E eu tão sem crença e as árvores tão nuas
E tu, gemendo, e o horror de nossas duas
Mágoas crescendo e se fazendo horrores!

Magoaram-te, meu Pai?! Que mão sombria,
Indiferente aos mil tormentos teus
De assim magoar-te sem pesar havia?!

— Seria a mão de Deus?! Mas Deus enfim
É bom, é justo, e sendo justo, Deus,
Deus não havia de magoar-te assim!

domingo, 3 de março de 2013


Páginas em branco


Tudo aquilo o que nos sempre vivemos,
Pelos rumos que tomaram nossas vidas,
Nas noites de insônia, mal dormidas
Na quebra das promessas que fizemos,

No rosto dos amigos que perdemos,
Nas canções que ouvimos repetidas
No gosto das tristezas escondidas
De amores de que nunca esquecemos.

Tudo isso faz parte de nossa história.
Historia que escrevemos dia a dia
Editadas em um livro na memória.

E a minha, pra lhe ser sincero e franco,
Dá-me um aperto, uma angustia e agonia
Quando olho tantas paginas em branco


Jenario de Fátima

sexta-feira, 1 de março de 2013

Mas era apenas isso, 
era isso, mais nada? 
Era só a batida 
numa porta fechada? 

E ninguém respondendo,
nenhum gesto de abrir:
era, sem fechadura,
uma chave perdida?

Isso, ou menos que isso
uma noção de porta,
o projeto de abri-la
sem haver outro lado?

O projeto de escuta
à procura de som?
O responder que oferta
o dom de uma recusa?

Como viver o mundo
em termos de esperança?
E que palavra é essa
que a vida não alcança?

Carlos Drummond de Andrade,